Thursday, October 25, 2007

Ainda sobre o mesmo Nobel.

Aqui deixo, não por ser complementar, mas por ser muito mais sério e mais correcto que o post anterior sobre o Al Gore, este texto do Rui.

Al Gore - de senhor da guerra a Nobel da Paz

Wednesday, October 24, 2007

Algumas verdades incómodas sobre Al Gore*

Nazanin Amirian

O ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore, foi um dos vencedores do Prémio Nobel da Paz 2007, "pelos seus esforços por construir e divulgar um maior conhecimento sobre as alterações climáticas". Ao Comité Nobel terão acontecido dois males para que tenha tomado tal decisão. O não encontrar na sua lista de candidatos nenhum defensor da Paz, e desconhecer o currículo do ex-vice-presidente. Pois, Al Gore não é nem um homem de Paz nem um aspirante a salvar a Terra com a sua visão ecologista.

Enquanto pacifista, baste recordar que a administração Clinto-Gore bombardeou a Jugoslavia, a Albania, o Sudão, o Afeganistão, o Iraque, o Haiti, o Zaire e a Libéria, utilizou todas as classes de munições destrutivas incluindo projécteis que continham urânio empobrecido, causando a morte de dezenas de milhares de civis e provocando irreparáveis danos ambientais, cujos efeitos perdurarão centenas de anos nas terras, ar e águas.

O excelentíssimo Comité deveria saber, por outro lado, que o actual herói do ecologismo quando entre 1993 e 2000 era vice-presidente do país mais poluente do mundo, e encarregue de todas as matérias ambientais, internas e internacionais do seu país, se negou a assinar o Protocolo de Quioto, acordo internacional para reduzir as emissões de gases que causam o aquecimento do planeta.

No seu documentário, oculta a verdade quando afirma que "somos todos responsáveis". Não diz que na realidade apenas 20% da humanidade, principalmente as multinacionais, cometem 80% das agressões contra o ambiente, nem que o consumo de energia de um cidadão do Primeiro Mundo é 70 vezes superior que o de um cidadão de um país em desenvolvimento. Na própria casa de Al Gore se consome 20 vezes mais energia que na de uma família média norte-americana!

Outra das pérolas da batalha do ex-vice é a sua defesa dos agro-combustíveis, ou cultivos energéticos como medida para reduzir a contaminação atmosférica. Que o milho e a soja substituam o cultivos de batata e arroz, alimentos básicos de centenas de milhões de pobres do planeta e, como consequência, colocar em causa a segurança alimentar.

A actual campanha de produção de monoculturas de matéria prima para os biocombustíveis já está provocando a desertificação de grandes superfícies, destruindo bosques, pastagens e solos agrícolas tradicionais na América Latina (Argentina, Brasil e Bolívia), na Ásia e na África para alimentar os "eco"-veículos. Uma desflorestação que aumentará a degradação ambiental e a emissão de gases, por drenagem de solos e agricultura intensiva, o que acelerará o aquecimento global.

Por detrás de tudo isto escondem-se os interesses das multinacionais do agronegócio de biocombustíveis.

*o texto acima é uma tradução do império do original em http://www.rebelion.org/noticia.php?id=57626. Claro que parte de uma análise com a qual não posso concordar e eu colocaria muitas aspas onde este documento não as tem. Ainda assim, releva bem a hipocrisia do senhor e do comité nobel e não deixa de ter o seu interesse.

Tuesday, October 23, 2007

O papel social da comunicação social.

Todos os dias, pelo menos durante a semana, os canais portugueses, com a excepção que todos agradecemos (mas que poucos realmente vemos) do canal 2 da RTP, encetam uma autêntica disputa pelo troféu da lamechiche matinal. Sinceramente, não sei se conheço todos os programas, mas há pelo menos 3.

O que significam estes programas que ocupam as manhãs dos dias úteis na íntegra, com programas de cerca de 3 a 4 horas? Numa altura em que o segundo televisivo vale muito dinheiro, mas também muito mais que dinheiro, que significam estes programas? Qualquer programa que ocupe entre 15 a 20 horas semanais nas nossas ondas hertzianas, em sinal aberto, tem de representar uma sério ganho, tem de ter um qualquer retorno bastante significativo.

Sim, é fácil perceber que estes programas são essencialmente destinados a reformados, pensionistas, idosos e a quem possa trabalhar em casa e que, utilizam um público fragilizado para rentabilizar e explorar a dor alheia. Dirigidos a um público que vive muitas vezes na solidão, ou mesmo no sistemático vai-vem aos serviços de saúde, com dores, com problemas sociais e económicos, estes programas usam como personagens-tipo pessoas que, por não haver serviço que lhes seja prestado, acabam por se prestar a esse serviço. Cada um destes programas é um desfile de "coitadinhos", de "aleijadinhos", "sozinhos", "toxicodependentezinhos", "pobrezinhos" que mete dó ao mais empedernido dos corações.

A receita é fácil: explora-se a dor do televisionado como forma de explorar a dor do telespectador. A velhota sozinha em casa, chorando o marido defunto, os filhos trabalhando longe e que raramente vê, antes de se chegar à escada para saber as novas do prédio, toma atentamente a sua dose tristeza, conformismo e resignação, vertendo a lágrima cristã perante o cenário heróico da vida daquela senhora que, na tv, mostra como é possível superar uma séria doença degenerativa, recorrendo à caridade por e-mail, posters nos cafés e chegando mesmo à tv.

A Júlia entrega-lhe a cadeira de rodas paga pelos patrocinadores do programa e ainda recebe chamadas de casa dos telespectadores que, chorando na sua bondade, abençoam a senhora risonha na sua nova cadeira de rodas.


Qual é o papel destes programas, então? além de serem, provavelmente, uma óptima fonte de receitas para as empresas que detêm os canais que os transmitem. Um fonte de receitas tão negra e tão decadente quanto uma igreja. Tal como qualquer igreja, estes programas recolhem fé e dinheiro por entre a dor e a desesperança. Tal como qualquer igreja, estes programas fomentam a apatia e o conformismo, o raciocínio linear e a caridade na sua forma mais patética.

Mas estes programas cumprem um outro papel. Ao afirmarem-se como defensores da causa social dos pobres, dos desfavorecidos, dos coitados, dos abandonados, estes programas avançam numa linha ofensiva no campo das ideias e dos comportamentos. Há uma questão que nunca é levantada nestes programas e essa questão é deliberada e estrategicamente omitida: o papel do Estado perante as diversas situações que ali passam como inevitabilidades.

Ou seja, estes programas não estão orientados apenas para o "money-making" pela exploração da dor e da miséria do telespectador e do convidado. Estão também orientados para a manipluação ideológica da consciência individual e colectiva. Uma importante função destes programas matinais é portanto a da criação generalizada da ideia da desgraça, mostrando um país perdido nas chagas da tristeza e flagelado pelos maus costumes, onde só quem transporta a fé, invidualismo e garra suficiente no seu coração, ultrapassará o purgatório nacional.
Cumpre o papel de dinamizar a ofensiva ideológica junto de camadas desfavorecidas da população. A ideia de que o Estado não tem um papel na prevenção de casos como os que ali são mostrados, de que perante eles o Estado não tem um papel e de que o próprio sistema que os gerou se encarregará deles, assim tenham os indivíduos força para disputar o seu apoio neste mundo cruel. A comunicação social aparece como uma extensão do capital que cumpre um papel do estado. não importa que ofereça uma cadeira de rodas por semana, quando seriam necessárias milhares. não importa que mostre apenas os casos dos toxicodependentes recuperados (mas ainda assim sem dentes paa serem suficientemente merecedores de compaixão) quando milhares continuam a carecer de cuidados de saúde e de ajuda no tratamento e mais ainda quando milhões de jovens portugueses sejam expostos e convidados ao consumo sem que exista uma séria política de prevenção. Nada disso importa. Importa apenas que se crie a ideia de que não há nada a fazer, a não ser batalhar muito pela esmola, para que os canais da comunicação social dos ricos possam olhar pelos pobres quando bem-comportados.

Sunday, October 21, 2007

ainda antes do OE2008

outubro. A pausa do Orçamento do Estado para 2008 está para chegar à semelhança de anos anteriores. Entretanto uma cirurgia atirou-me um pouco ao chão de cansaço.

Mas não o suficente para ir descansar de olhos fechados.

E hoje, eis que abro os olhos e vejo num dos deprimentes telejornais que nos são servidos nesses canais de televisão, o senhor presidente da república saúdar o governo pela capacidade que teve de estabelecer o Tratado de Lisboa.

Apesar do grandioso embuste montado em torno do papel do governo português no chamado Tratado Europeu, a situação em que nos encontramos não deixa de ser política e socialmente preocupante.

1. o embuste: alguém acredita mesmo que o facto de portugal ocupar neste momento a presidência europeia tem alguma coisa a ver com os consensos estabelecidos em torno do tratado? alguém acredita, porventura, que foi a extrema e mundialmente reconhecida capacidade negocial diplomática portuguesa que conseguiu catapultar um texto da sepultura novamente para a cena política actual? claro que o papel de portugal, tal como do governo português nos textos, nos tratados, nos conteúdos, nos acordos, nas estrtégias, é completamente insignificante. No entanto, a ideia de que o governo português tem sido, no âmbito da presidência, um elemento fulcral ao desenvolvimento da estratégia europeia do grande capital e, no mínimo, ridícula. A exaltação dessa ideia, por outro lado, tenta criar sub-repticiamente, um clima de confiança popular neste governo decrépito - ou seja, é mais uma das grandes grandes armadilhas mediáticas e propagandísticas que este governo nos tem montado. desta feita com a ajuda do presidente da república, o que também não é de espantar. E, claro, com a sempre prestável complacência e até incentivo da própria união europeia federal da qual o governo português é aplicado pupilo. O capital vai tecendo a matriz das suas novas regras legais na europa, com a ajudinha de todos, e todos ajudando o governo do capital.

2. o local: o presidente da república... sim... é incrível mas é esse mesmo, Aníbal Cavaco Silva, fez parte da comitiva oficial da inauguração do museu do neo-realismo que, se não estou em erro, se situa em Vila Franca de Xira, terra natal de Alves Redol. Nessa comitiva participava também a ilustríssima senhora ministra da colecção berardo (também chamada de "cultura" desde 2005 em Portugal). E lá andavam sempre de sorriso todos inaugurando o bonito museu. Nas suas caras era indisfarçavel a náusea cada vez que observavam qualquer parte do museu, fosse um livro de alves redol, uma gravura de álvaro cunhal, lá lhes vinham os vómitos à boca. Mas claro, mantém-se a pose: aliás até convém varrer para a dimensão das memórias o movimento neo-realista, para o corredor enfermo dos museus, desde que não fique por aí nas ruas, no sangue palpitante das gentes. Mas voltando ao que aqui me trouxe: o local e a ocasião. Cavaco Silva foi, como é habitual, entrevistado por um vasto conjunto de jornalistas de diversos órgãos de comunicação social. E que nos disse sobre o neo-realismo? nada. Absolutamente nada. Valorizou o empenho do Governo de Sócrates e a capacidade de chegar a um novo Tratado. Sobre referendo: que a Assembleia da República e o Governo darão em devido tempo a sua palavra e só então, por essa altura se pronunciará. E pronto, cumprida a visita fastidiosa de "musealização" da luta artística do movimento neo-realista, restava apagar completamente a importância das obras, da sua ligação com determinados períodos da história, da sua íntima relação com a luta do povo português, da sua permeabilidade com o movimento operário e comunista. O que melhor se não a Constituição europeia.
Que se aprove e sem referendo, a todo o gás!

além de estar fisicamente incapacitado de trabalhar e de escrever aqui muito, vamo-nos v(l)endo.

Monday, October 08, 2007

estes comunistas estão loucos

Está em curso uma campanha de propaganda governamental como eu nunca tinha visto - convenhamos, no entanto, que a minha idade não me permite extensas memórias - que teima em negar a realidade através da injecção diária de conteúdos definidos a rigor. Perante uma realidade cada vez mais degradante, em que as condições de vida da população, dos jovens, das mulheres, dos estudantes, dos trabalhadores, o governo e os meios de comunicação social insistem das teses surrealistas de que tudo vai bem e de que tudo melhora a olhos vistos.

O plano tecnológico veio para nos resolver todos os problemas e somos o país do futuro - só não vê quem não quer. Quem não quer e os comunistas, pois claro. Esses famigerados seres por quem deus nunca quis distribuir uma réstia de inteligência e que teimam em protestar as políticas de progresso do governo qual insatisfeitos primatas.

Mas adiante.

Esse grupo de descontentes irascíveis que dão pelo nome de comunistas até propuseram na Assembleia da República, durante a semana passada, um projecto de resolução para a utilização de software livre na referida Assembleia. Claro que o grupo parlamentar que sustenta o governo não podia permitir que um projecto de resolução tão retrógrado e antiquado pudesse pôr em causa os interesses progressistas da vanguarda tecnológica e humanista também conhecida por "microsoft" e vai daí e chamou a si toda a sua coragem para a defesa dos desprotegidos e retalhou o Projecto de Resolução até ele ser apenas uma amostra do que era, como bem podemos ver aqui (lamentavelmente não disponível ainda em software livre). Claro que ainda assim, o PS não pôde impedir um retrocesso civilizacional que vem comprometer a Assembleia da República com a disponibilização de todos os seus conteúdos em formatos abertos (credo!) para o exterior de forma a que nenhum cidadão seja obrigado a dispôr de ferramentas "microsoft" para ler os documentos produzidos pela Assembleia da República.

Mas os comunistas não se ficaram por aí. E mesmo no meio de tanta manifestação que por aí promovem apenas por má-vontade, ainda arranjaram tempo para apresentar um Projecto de Lei para a criação do Conselho Nacional das Tecnologias de Informação e Comunicação. Ora, poderia o incauto ou ingénuo questionar-se: "faz sentido isto, não? já que há tanta conversa sobre tecnologia, ao menos que se envolvam as entidades da área..." Mas não é esse o entendimento do governo. Ora, se temos um Plano Tecnológico que é nosso e parte do nosso programa de governo (depois de ser um "choque" no programa eleitoral) porque raio deveríamos agora ir discuti-lo com outros?

"estes comunistas estão loucos"

Saturday, October 06, 2007

Banshee. Bird

Porque há resistência cultural no seio do império:

Os banshee and something else we can't remember lançaram o muito esperado álbum de estreia "this place is a zoo". Está à venda e recomenda-se, tal como os concertos ao vivo. Energia, good vibe e um som original. Site. myspace

Também queria deixar aqui uma nota sobre uns putos que têm um som muito fixe e que acho que vale a pena dar uma atenção, que acho ainda vão dar que falar. bird

1933 - análise sobre testemunhos de Lénine - a questão da base social da luta da mulheres

Tradução minha:

"No decurso das suas actividades revolucionárias, Lénine falava e escrevia frequentemente sobre a emancipação da mulher em geral, da mulher camponesa em particular. A emancipação da mulher está inseparavelmente ligada à luta mais geral dos trabalhadores pelo socialismo. Conhecemos Lénine como líder dos trabalhadores, como organizador do Partido e do governo Soviético, como um lutador e um construtor. Cada trabalhadora, cada camponesa deve saber sobre tudo quanto Lénine, cada aspecto do seu trabalho, sem que se limite a si própria ao que Lénine disse sobre a posição das trabalhadoras e sobre a sua emancipação. Mas porque existe a mais próxima ligação entre a luta mais vasta da classe trabalhadora e a melhoria da posição das mulheres, Lénine muitas vezes - em mais de quarenta ocasiões, de facto - se referiu a esta questão nos seus discursos e artigos e cada uma dessas referências estava inseparavelmente ligada a todas as outras coisas que eram do seu interesse ou preocupação."

Krupskaya, Novembro 1933

Wednesday, October 03, 2007

o preconceito toldou-lhe as vistas

"Em edição de 1 de Outubro do Jornal “Público”, Helena Matos escreve um artigo entitulado “Foz Côa: uma história de enganos” que se inicia exactamente com citação do Secretário-Geral do Partido Comunista Português. Cedo o leitor se apercebe que o referido artigo consiste em nova incursão jornalística pelos meandros do anti-comunismo, sem que tenha havido sequer um esforço da autora para compreender a intervenção do PCP em matéria de Áreas Protegidas. Na verdade, o Secretário-Geral do PCP não se encontrava em “visita à zona do Parque Nacional da Peneda-Gerês” como refere Helena Matos, mas antes participava num Encontro/Audição sobre Áreas Protegidas organizado pelo PCP, iniciativa pioneira no panorama partidário português. Certamente, tal iniciativa, que contou com a participação de uma centena de pessoas, entre as quais, técnicos, sociólogos, biólogos, engenheiros florestais e agrícolas, agricultores, autarcas, habitantes locais do Parque Nacional Peneda-Gerês e até de outras Áreas Protegidas do país, não constituiria matéria jornalística. Assim, entendeu Helena Matos pegar numa frase desgarrada e descontextualizada do Secretário-Geral do PCP para levar a cabo a sua missão central naquele artigo: desvirtuar os conteúdos da intervenção comunista e, já agora, aproveitar para puxar pelo preconceito latente do anti-comunismo primário que, à falta de motivo de escrita, serve sempre o jornalista que escolhe o caminho mais fácil.

É, pois, importante que sejam clarificadas algumas questões:

1. O Secretário-Geral do PCP, tal como outros dirigentes nacionais e regionais do Partido, deslocaram-se ao Parque Nacional Peneda-Gerês para uma iniciativa do PCP realizada a 29 de Outubro, no âmbito da preparação da sua Conferência sobre questões Económicas e Sociais, com data prevista para os dias 24 e 25 de Novembro. Entende o PCP que a questão da protecção da Natureza e das áreas protegidas, bem como o seu cruzamento com a vertente económica, social e cultural da vida das populações é uma matéria central na política de gestão territorial que o PCP preconiza. A iniciativa que teve lugar no Parque Nacional Peneda-Gerês foi de carácter nacional e o local escolhido foi a Casa do Povo da Vila do Soajo, como forma de relacionar directamente o espaço em que decorreu com a problemática da democratização da gestão e do usufruto da Natureza.
2. Uma das questões mais focadas pelos diversos intervenientes na referida iniciativa foi exactamente a dos constrangimentos legais impostos às populações das áreas protegidas. Aparentemente, Helena Matos escreveu uma peça jornalística sem se dar ao trabalho de investigação mínima. Bastava ter passado os olhos pela intervenção do próprio Secretário-Geral do PCP onde se lê:
“É para nós inquestionável a necessidade e a importância das Áreas Protegidas para a preservação e valorização do património natural, cultural e paisagístico, mas é também para nós incontestável que estes territórios e a sua gestão têm, antes de mais, que garantir às suas populações possibilidades de assegurar um modo de vida condigno.
Infelizmente nem uma coisa, nem outra, foram conseguidas, pelas erradas políticas que em todos estes últimos anos se foram concretizando.
Políticas que, por um lado, não impediram a degradação de muitos desses espaços e que ficaram muito aquém dos objectivos de valorização que proclamavam e, por outro, fizeram tábua rasa da ideia de que estes territórios são terra com gente – terra humanizada – em que as populações locais são, em geral, detentoras da quase totalidade da propriedade do território que o moldaram com trabalho árduo desde tempos ancestrais e que são a mais sólida garantia para o seu futuro desenvolvimento sustentado.
Políticas que discriminaram negativamente as populações destas regiões em termos de investimento público, incluindo na preservação do próprio património e lhes impuseram limitações às suas actividades e às suas vidas sem qualquer contrapartida.
E se há custos que podem ser inevitáveis para uma eficaz defesa das Áreas Protegidas, esses custos não podem ser lançados apenas para cima dos que lá vivem e enfrentam toda a espécie de condicionalismos e restrições.” E também: “Estamos aqui numa região que sente particularmente essa discriminação e que crescentemente tem estado confrontada com as desastrosas políticas nacionais e comunitárias para a agricultura e a floresta, com a sistemática omissão e ausência de efectivas políticas de desenvolvimento regional, com as políticas de restrição orçamental que inviabilizam a criação de infra-estruturas essenciais e com as politicas neoliberais de ataque aos serviços públicos.”

3. Infelizmente, Helena Matos considera que o turismo constitui compensação suficiente às populações das áreas protegidas. Saberá, no entanto, que nem todas as áreas protegidas são destino turístico, tão bem quanto saberá que cada vez mais o turismo em Portugal é promovido em divórcio com as populações, com os seus hábitos e costumes e, mesmo, com as suas actividades económicas. Saberá certamente Helena Matos que, cada vez mais as áreas protegidas são campo fértil ao desenvolvimento turístico de grande porte, fechado e distanciado dos cidadãos autóctones, cujos lucros são crescentemente concentrados num conjunto reduzido de grupos económicos. Tal como saberá Helena Matos que, pese embora o maior fluxo turístico, as palavras de Jerónimo de Sousa proferidas no Encontro/Audição do PCP são o reflexo da realidade: “Isso tem-se visto na falta de apoio à reflorestação das zonas ardidas e ao ordenamento florestal: na não criação de bolsas de água para combate aos fogos; na falta de medidas que garantam às populações da serra da Peneda e Soajo, como as das freguesias de Gavieira e Soajo, serviços adequados de telecomunicações – telefone móvel – e transportes públicos rodoviários; no incumprimento de promessas de apoio, como foi o caso das ajudas para alimentação animal no caso dos fogos; no arrastamento do pagamento das indemnizações devidas pelos prejuízos causados pelos lobos; no encerramento dos serviços de saúde de urgência, cada vez mais longe, com é o caso recente do fecho da urgência em Arco de Valdevez pelo actual Governo.”
4. Sobre o “autoritarismo” que atribui implicitamente ao PCP, talvez fosse bom que estivesse estado presente no Encontro/Audição para presenciar por si própria, acompanhada do Jornal “Público”, a forma como dezenas de pessoas expuseram a sua revolta contra as imposições do Governo PS, vendo no PCP a organização capaz de a ouvir e de lhe dar volume político.

Estivesse Helena Matos preocupada de facto com os cidadãos portugueses que vivem em áreas protegidas, estivesse empenhada em denunciar as políticas de agressão social que os sucessivos governo têm levado à prática nessas áreas e certamente ter-se-ia, no mínimo, dado ao trabalho de ler a intervenção de Jerónimo de Sousa. Estivesse Helena Matos preocupada com a gestão territorial do país e certamente saudaria a iniciativa do PCP, primeira no quadro político-partidário nacional."

Monday, October 01, 2007

ICN(plano)B

Enquanto comunistas, a relação das populações humanas com a Natureza é uma das questões centrais com que nos cruzamos, mas também a relação do Estado com os recursos naturais e com o território constituem aspectos centrais de uma análise que em tudo difere da perspectiva capitalista, perspectiva essa que o actual governo, como os anteriores, tem aplicado.

Na verdade, se atentarmos às políticas dos últimos governos em matéria de Ambiente e ordenamento do território, facilmente verificamos que essa política assenta em dois vectores estruturais que são a trave mestra da política de direita. Esses dois vectores são:

1. a política do abandono do território e do afastamento das populações das áreas protegidas, conduzindo a uma situação de crescente degradação. Uma perspectiva que redunda no não usufruto democrático dos recursos e da Natureza, quer em termos económicos, quer em termos sociais. Frequentemente, as áreas protegidas acabam por representar um impedimento objectivo ao desenvolvimento de práticas milenares ou centenárias das populações autóctones sem que daí resulte uma valorização do território para o país. Pelo contrário, esta política do abandono do território e das áreas protegidas acaba por provocar também a degradação física das áreas protegidas, já que, afastadas que se encontram das populações e do Estado, não existe verdadeira intervenção de manutenção nem de promoção dos valores ambientais.

2. a política de entrega e venda a retalho do território e das áreas protegidas, nomeadamente dos valores e recursos naturais, do solo ao sub-solo, e mesmo da atmosfera. Aparentemente contraditória com a política do abandono, não o é de facto. A entrega do território nacional a interesses privados que se estendem desde a exploração e extracção de recursos naturais até aos enormes projectos turísticos acaba por ser um dos possíveis resultados da retirada do Estado e das populações. O capital permite-se à destruição da Natureza com a complacência do Estado e ainda consegue apoderar-se das porções intactas ou semi-intactas para seu usufruto exclusivo.

A estratégia política deste governo, no entanto, atingiu um novo patamar no que toca à relação do Estado com a Natureza. Sem que abandone os dois vectores já referidos, o Governo avança numa perspectiva ainda mais liberal, permitindo ao capital e aos interesses privados, não só a capacidade de utilização dos recursos naturais a seu bel-prazer, mas também a participação directa na sua gestão. Isto representa que o actual momento histórico acarreta a possibilidade de obtenção de lucro através de uma actividade que antes não apresentava esse potencial no passado. Assim, os interesses privados acentuam a sua vontade de interferir directamente na gestão da Natureza. É exactamente isso que começa a acontecer com a reestruturação do ICN em ICN(B). O governo afirma claramente que a nova filosofia que preside ao ICN é a da proliferação daquilo a que o governo chama as parcerias público-privadas e que, a experiência bem nos mostra que na realidade são privatizações e concessões. A visitação e a gestão serão inseridas nessas tais de parcerias – numa entrega do ouro ao ladrão. A fiscalização permanecerá competência exclusiva do Estado, mas só porque a lei não permite o contrário. O Governo entrega aos interesses que delapidam a Natureza a sua gestão. Quer sejam da indústria extractiva, do serviço turístico de luxo ou da produção florestal, aí estarão esses agentes da destruição a gerir os parques naturais.



nota: Na IX e X legislatura, o PCP apresentou mais de uma dezena de projectos de lei, diversos projectos de resolução e apreciações parlamentares e várias dezenas de requerimentos relativos à gestão territorial, à conservação da Natureza e à política de ambiente. Projectos que vão desde a criação de áreas protegidas à alteração das normas do ordenamento do território. O PCP questionou directamente o Ministro do Ambiente sobre a reestruturação do ICN, sobre as condições de trabalho dos vigilantes da natureza, sobre os meios de que dispõem diversos parques naturais, sobre atropelos à lei no seio dos Parques; mas também através de perguntas escritas ao governo colocou um sem número de questões sobre o papel do governo na preservação da natureza.