A utilização da palavra "liberdade" associada à propaganda capitalista tem um pendor ideológico marcado, mas não deixa de gerar propositadamente ilusões entre aqueles que não distinguem a diferença entre o "livre" de "mercado liberalizado" e o "livre" de "acesso livre ao conhecimento" por exemplo.
No mundo da Educação, uma forte campanha em torno da chamada "liberdade de escolha" vem sendo montada engenhosamente pelos proprietários das escolas privadas e com o forte contributo da direita. Por todo o mundo, coloca-se a questão da "liberdade de escolha em educação", sempre fruto dos esforços - não do povo - mas dos proprietários do mercado capitalista da educação. A "liberdade de escolha em Educação", segundo os interessados, consiste na adopção pelo Estado de um mecanismo que financie a Escola Privada tal como a Escola Pública e assim assegure a "liberdade" de escolha. Numa primeira abordagem, pensaremos todos: "realmente faz sentido, se o Estado tem de me assegurar o direito à Educação, por que não garantir-me esse direito na Escola que eu quero para os meus filhos?"
Várias questões se levantam e a primeira é a da equidade: Se todos os pais pudessem escolher a escola dos seus filhos, como seriam escolhidos os alunos das escolas mais concorridas? Para onde iriam os restantes? Estarão os pais a escolher as escolas ou afinal as escolas a escolher os pais e os alunos?
Assim, a atribuição de um financiamento à família - através do chamado cheque-ensino - ou de um financiamento à escola privada, não elimina a triagem feita por cada escola, na medida em que será de esperar concentração da procura nas escolas com mais qualidade de ensino. Aqueles que, mesmo portadores de cheque-ensino, não encontrem lugar na escola da elite serão relegados para outra, e assim sucessivamente até à escola degradada e de má qualidade.
Dizem-nos que a liberdade de escolha com base no cheque-ensino é a única forma de garantir que os filhos dos pobres consigam aceder aos melhores colégios privados. Ou seja, que só o financiamento do Estado ao ensino privado poderia criar essas condições. Obviamente que o financiamento público do ensino privado não garantiria em momento algum, o acesso dos mais pobres ao ensino de luxo, como já vimos antes. Na prática, estamos perante um embuste para que os impostos dos portugueses sejam desviados para financiar as escolas dos ricos, pois vejamos: os impostos hoje já financiam a escola pública e, através do cheque-ensino, continuariam a financiar na mesma medida ou até menos; assim a atribuição do cheque-ensino e a abertura da suposta "liberdade de escolha" representaria na prática o desvio massivo de dinheiro proveniente dos impostos para os colégios onde os ricos entendessem estudar aos quais, como os próprios colégios se encarregariam de tratar, apenas os ricos teriam acesso.
Claro que muitas outras questões se levantam, nomeadamente em torno da elitização do ensino, da massificação de resposta privada de má qualidade, de degradação da qualidade da escola pública por ainda maior diminuição do seu financiamento, etc., mas destacaremos apenas uma mais: a da natureza política do ensino privado versus a natureza política do ensino laico.
A sobrevivência da democracia depende do acesso ao conhecimento e às ferramentas interpretativas do mundo que nos rodeia. Como tal, a escola representa um pilar fundamental da concretização dessa democracia, pois só em igualdade de circunstâncias existe democracia. A concentração do saber numa elite e a generalização da ignorância nas restantes camadas das massas gera uma iniquidade matricial que impede objectivamente o aprofundamento da democracia. Como tal, a democracia está condicionada pela existência de uma escola da república, uma escola laica e liberta de qualquer interesse que não o do colectivo e do Estado. O financiamento com frutos dos impostos de escolas que podem servir interesses alhieos aos do povo e do estado é um caminho suicidário para a democracia.
Na verdade, os filhos dos ricos continuariam a frequentar colégios de luxo, mas pagos por todos nós ao mesmo tempo que a Escola Pública não tem recursos para cumprir o seu papel constitucional. Além disso, a questão da "liberdade de escolha em Educação" ilude uma questão central: é papel do Estado permitir que todos estudem no ensino privado - seja ele de luxo ou de miséria - ou é papel do Estado assegurar que ninguém precisa de acorrer ao privado por encontrar no público tudo o que precisa?
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