Friday, April 04, 2008

"se fosse meu filho partia-lhe os braços"

A violência nas escolas e a indisciplina são fenómenos intemporais e persistentes. Não se compadecem com a atenção que, por um motivo ou outro, a comunicação social lhes dá apenas em determinados momentos. A forma como se tentam criar ondas de histerismo em torno de um problema que está ali há tanto tempo deve levar-nos a reflectir. Que interesses servem estes espasmos mediáticos, estes escatológicos agoiros?

Em torno de um vídeo no Youtube tem-se feito uma novela de dimensões que, não fora a seriedade do problema, se aproximariam do ridículo. A violência nas escolas, a indisciplina, as armas, etc. A sic faz especiais, o problema dura há duas semanas nas páginas dos jornais. Mais uma vez a comunicação fortemente apostada em criar um clima de desânimo e desesperança a apelar àquele sentimento famoso do "no meu tempo não era assim"...

Todas as gerações têm por hábito dizer que a juventude está perdida, que no seu tempo as coisas "não eram assim". Se fôssemos a julgar o actual estado da Humanidade e das sociedades pela súmula dos comentários das sucessivas gerações em relação às juventudes, diríamos estar perante o caos absoluto, perante uma sociedade de regressão civilizacional e tecnológica.

A julgar pela degradação moral, estética, social e cultural de que acusam a juventude de agora na sequência de terem sido no passado acusados tal e qual como fazem agora, estaríamos pois perante a mais javarda das épocas da história da Humanidade, estaríamos provavelmente próximos da Era do Verme Mentecapto. Mas curiosamente isso não se verifica. Estamos pelo contrário, perante a mais desenvolvida das épocas do Homem, onde a inteligência é a matéria-prima de um conjunto de processos que nunca antes tinham tido tanta expansão. Apesar do sistema capitalista, os dias contemporâneos donde não excluímos as experiências socialistas são os dias do Homem.

Esta é uma era de degradação material para uns e de enriquecimento para outros. Mas é inequívoco o crescimento do somatório da criatividade e capacidade humana.

E, no entanto, há uma pressão brutal que a todo o custo visa desacreditar a juventude, que visa criar uma sensação de desnorte moral e social. Que visa acima de tudo justificar as opções que já se preparam de regressão a um passado político que não esquece mesmo quem o não viveu.
O sistema precisa de uma componente cada vez mais hiper-vigilante, mais controladora, securitária e autoritária. O sistema precisa desse controlo permanente como forma de condicionar o comportamento humano, como forma de eliminar os comportamentos revolucionários, críticos e dinamizadores do pensamento colectivo. O sistema precisa disso na medida em que precisa da exploração. O sistema sabe melhor que as classes trabalhadoras que a exploração é insustentável no longo prazo e que, inevitavelmente, essas classes tomarão consciência transformadora. A questão é retardar.

Criar a ideia de que a escola é um meio violento, no seio do qual os estudantes não podem ser livres porque são vândalos é o primeiro passo para instigar medidas securitárias e autoritárias. No dia em que justificamos a videovigilância nas escolas, o cartão magnético, o controlo total sobre a vida do estudante, estamos a aceitar implicitamente e a médio prazo que o mesmo aconteça com os trabalhadores no local de trabalho. Daí é um passo até à expansão do modelo securitário para toda a sociedade.

À margem de tudo, continuam os problemas sociais e as irresponsabilidades acumuladas dos sucessivos governo e que são a verdadeira causa radical dos fenómenos de exclusão e violência escolares. À margem de tudo isso continuam os esforços dos estudantes e dos professores para construir uma escola democrática e inclusiva. À margem da Comunicação Social e da fúria histerizante dos especiais da tv e das capas dos jornais continuam as propostas do PCP na Assembleia da República.

5 comments:

Sal said...

Precisamente. Não poderias dizer melhor.
O modelo securitário tem já uma pequena implantação. Já sabemos que a existência do tão famoso "cartão-único", vai condicionar a liberdade individual, e dar início à marcha que, no limite, culmina com o controlo total de todas as pessoas. É assustador pensar que alguém pode ter acesso a todos os nossos documentos. E se estes estiverem, como estarão, informatizados, então é melhor nem pensar na multiplicidade de problemas a que poderemos estar sujeitos.

beijinhos

Fernando Samuel said...

E continuam as «bocas» dizendo que o PCP é só «do contra», que apenas diz mal e não faz propostas, etc, etc...

Anonymous said...

É isso tudo!

Anonymous said...

Excelente post.
Sobre a menorização da juventude pelo sistema capitalista, é muito interessante o ensaio do Pierre Bourdieu intitulado "A "juventude" é só uma palavra" ("Questões de Sociologia", Eds. Fim de Século, pp. 153-162).

samuel said...

Post certeiro.

Abraço