Hoje foi discutido na Assembleia da República um Projecto de Lei do PCP que sustentava a revogação das taxas revogadoras praticadas no serviço nacional de saúde. A direita uniu-se, com a mãozinha do Partido Socialista, também ele cada vez mais posicionado à direita e mais uma vez manifestou a sua visão retrógrada perante os serviços públicos.
A verdade é que a política deste governo tem estado apostada no desmantelamento dos serviços públicos, não fazendo excepção do Serviço Nacional de Saúde, conquista irrevogável da Revolução Democrática de Abril. Das bancadas da direita, contando sempre a partir do corredor que divide as bancadas do PS e do PCP, sentiu-se o maior repúdio pela população. Acusou de tudo os portugueses que recorrem às urgências dos hospitais. Acusou-os de despesistas, alarmistas, abusadores, hipocondríacos, enfim… PS, PSD e CDS foram tão unânimes quanto reaccionários, sustentando que as pessoas vão às urgências porque este serviço é barato. Para estes partidos, o pessoal, os velhotes e tudo, vão às urgências porque curtem a cena de passar 5 a 6 horas num hall mal-cheiroso, onde se vê de tudo, desde o toxicodependente a vomitar ao nosso lado, ao velhote cadavérico que morre ali mesmo no corredor ao lado sem sequer um familiar que o abrace no último fôlego.
É isto mesmo. Eu, que me dirijo sempre que necessário às urgências dos hospitais públicos, gosto tanto de lá ir como de passear junto ao rio numa tarde soalheira. Aliás, como aquilo até me sai mais barato que umas bjecas na cervejaria mais próxima, vou ali desbundar uma beca as urgências do hospital, às vezes até convido os meus amigos e fazemos lá grandes festas.
E é muita giro! Mesmo ao nosso lado costuma estar sempre a acontecer uma rave da terceira idade reumática e hipertensa. São um clube muito restrito, porque não basta ser velho, tem de se ser também reumático e hipertenso.
Ora bem, para estes partidos, a desculpa é a seguinte: “Se houver taxas moderadoras, o pessoal não abusa dos hospitais.” Na verdade escondem a real intenção – fazer pagar pelo serviço público, pois é esse o primeiro passo para acabar com ele. Aquilo que é pago não é público, é híbrido… está na fronteira entre o público e o que em breve será privado. Utilizarei como ilustração a Educação. A educação pública era gratuita logo após o vinte e cinco de Abril. O governo de Cavaco Silva introduziu novamente o pagamento da taxa, vulgo propina, e daí até essa taxa atingir valores completamente descabidos foi espaço curtíssimo de tempo. Os estudantes permitiram a introdução da propina… o que estava em causa não era tanto o seu valor, mas a sua carga ideológica, o seu significado político e social.
Acontece que hoje, muito pouco tempo depois (cerca de 15-20 anos) as propinas já estão em 900€ e já impedem muita gente de estudar. Isto veio sem dúvida constituir o grande passo em frente do Ensino Superior Privado. Cada vez é mais semelhante o valor da propina no público e no privado. Quem ganha? A rede privada de educação que, curiosamente, consegue cobrir todo o território nacional, proeza que não consegue a rede pública universitária.
Ora, com a saúde está a passar-se o mesmo. A introdução da taxa moderadora, escudada num conjunto demagógico de pretextos, não é mais do que o início da mercantilização da saúde. Quem não quer uma saúde pública gratuita são as grandes empresas que exploram agora hospitais. A saúde pode ser uma autêntica máquina de fazer dinheiro, porque é algo a que não podemos escapar, se estamos doentes, temos de ir…
As taxas moderadoras continuam a existir… barbaramente. Irão aumentar, barbara e desproporcionadamente. Quem ganha? Ganha o neo-liberalismo e os hospitais e clínicas privadas. Quando for impossível recorrer ao Serviço Nacional de Saúde, quer pelos exagerados preços, quer pela fraca prestação de um serviço que tem vindo a ser desmantelado, então os utentes serão obrigados a ir ao privado. Quando não restar um centro de saúde para escoar doenças menos urgentes, quando no hospital público, ao invés de esperarmos as 5 horas habituais pelo atendimento, esperarmos 10 por não existirem médicos no sector público, então, serão os privados a solução. Tudo bem… para quem? Para quem tiver dinheiro para pagar… quem não tiver… morra longe.
Isto está cada vez mais uma América. Acabe-se com a hipocrisia. É tempo de ir aos bolsos de quem tem dinheiro. Porque é que a banca e o sector financeiro pagam quantias miseráveis de impostos, quando são os sectores que mais lucram? Porque é que as transacções bolsistas não pagam impostos sobre as suas mais-valias? Para não ir a estes bolsos gigantescos buscar dinheiro e, pelo contrário, para os enriquecer cada vez vez mais temos cá o PS, o PSD e o CDS, paladinos do lucro, da desumanização e da exploração, sob a capa da hipocrisia e das lágrimas nos olhos pelos pobrezinhos.
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